quarta-feira, 30 de junho de 2021

 Para com essa porra aí mermão.

Continua trampando e malhando que o futuro é seu. Que se fodam as oportunidades perdidas. 

Eu quero é mais,

eu quero é a sua alma.

segunda-feira, 23 de março de 2020

Not The Chosen One


You are not The Chosen One. You are were not The One. You are not The Only.

And I am so

So much Sorry

About this.



     Nosso relacionamento acabou e tudo que restou foi uma máscara de teatro fantástico em miniatura, daquelas que os venezianos utilizariam em seus carnavais tradicionais, toda adornada de brilhos dourados e fixada ao rosto por uma pequena haste metálica em que se segura. Foi tudo que você me deu, e é tudo que eu posso usar para retomar às nossas memórias, fora todas as experiências incríveis que vivemos juntos, condenadas a serem apagadas pelo tempo, tal qual fará a maresia com as rochas da costa.
     Talvez essa seja a pior parte, sabia? Viver algo tão incrível com alguém e ser forçado a se convencer de que não era tão bom quanto você imaginava. Quando você terminou tudo, eu achei que tudo tinha acabado. Com o tempo, percebi que não podeira ter de volta o que se fora, e o primeiro exercício que me propus foi enxergar o lado positivo de tudo aquilo. Foi no dia 21 de junho terminou. No dia 22, eu já estava te superando. Estava sorrindo comigo mesmo. Estava mesmo? Será que eu estava superando tudo, ou estava apenas mentindo pra mim mesmo de que tudo ficaria bem?
     Bom... A realidade é que a vida tem, de fato, seus aspectos positivos e negativos. Nos cabe apenas atropelar visceralmente os negativos, por mais que nos doa, e abraçar os positivos, tentando transformá-los em algo de bom. Os nazistas fizeram um dos maiores massacres até agora propostos pela humanidade, mas foi sua tecnologia que ajudou nós americanos a construir foguetes e conquistas a Santa Lua. Que se fodam os seis milhões de judeus que foram assassinados covardemente. Nós ganhamos a Guerra-Fria!!!
     Foi isso que eu fiz. Eu fiz o que os americanos fizeram. Esta barbárie, esta matança, este crime. Aceitei dentro dentro do meu território e dei cidadania a todos aqueles que eu apenas via como meus inimigos. Nossos inimigos. Aceitei que se tornassem bons para mim os cientistas malucos, médicos torturadores, oficiais e militares sádicos, apenas para que eles me dessem um ponto de vista do que era positivo em terminar com você. Talvez seja essa a realidade pragmática da vida. Não sei. 
Eu não sei de nada
     
     Tudo que eu sabia é que não queria continuar sendo miserável daquele jeito, chorando por sua causa e lamentando a injustiça universal. Sempre fui indiferente a tudo aquilo, mas agora esse "tudo aquilo" me machucava: a maneira como tudo que damos nem sempre recebemos. Quantas vezes você gozou e não me retribuiu? Quantos presentes minhas próprias mãos de artesão fizeram para ti e a ti eles eu entreguei? Quanta dedicação e amor eu dediquei a você, apenas para ser apunhalado no final? É difícil não sentir que fui injustiçado. Mas é isso que a vida é: injusta. Keep yout friends close and your enemies closer. Quantas vezes um inimigo teu te fez algum mal? E um amigo? Quantas vezes foi um amigo que te machucou? Compare os números e encontrará a piada de todos os tempos.

     Por isso tudo, eu adotei uma nova perspectiva dos fatos. A partir desse momento, não me interessava mais se você foi a melhor experiência que eu já tivera, pois eu deveria te esquecer para continuar vivendo. Não havia escolha. Apenas aceitando as injúrias e agarrando-me ao que era feixe de esperança, eu poderia voltar a viver. Margot, até o momento que eu escrevi essas palavras, você foi a mais incrível mulher que eu conheci. Ao menos foi assim como eu senti tudo. Mas, porque as coisas foram como foram, decidi que você não era tão incrível assim. Refleti e conclui que você não era tão incrível como parecia ser. Percebi que você era apenas improvável, mas, de forma alguma, excepcional. Ninguém é tão excepcional que não possa ser substituível.
Mas, novamente, será que isso é a verdade, ou apenas a maneira como eu decidi enxergar as coisas? Nunca saberemos.

Será que iriamos nos casar e ter filhos lindos

Com ansiedade e déficit de atenção?

Será que nosso relacionamento iria ser saudável para sempre

Como sempre fora com você se apoiando na minha atenção para saciar sua insegurança?

Será que o sexo ia ser sempre bom

Mesmo quando era eu quem fazia todo o trabalho e você só aproveitava?

Será que você ia aprender a me fazer gozar

E eu finalmente ia conseguir curtir o sexo tanto quanto você curtia?

Será que você ia aprender a ser melhor que você mesma e seus defeitos

Só para encaixar alguém dentro do seu coração?

     Será que isso tudo é a verdade

Ou você só me forçou a tornar os aspectos negativos maiores que os positivos

Até que eu enxergasse que

Na realidade

Eu sou muito melhor sozinho

Sem você

E você estava apenas atrasando a mim e ao meu propósito

como todos seus defeitos e inseguranças?

     Você me deu a chance de corrigir meus erros, mas nunca se deu a chance de corrigir seus próprios erros, cujos quais eu poderia perdoar. O lado positivo sempre foi maior que o negativo. Eu sempre te amei apesar de tudo. Nada disso superava o quão era incrível estar perto de ti. Mas você me forçou a abraçar a morte. Foi então que ela sussurrou no meu ouvido que todas as mazelas entre nós deveria se tornar argumento para o nosso fim. Nada disso me incomodava, mas você tornou isso argumento e você fez com que tudo fosse, mesmo, apenas porque "Não era pra ser". Certamente, não era. Uma mentira dura que se engole como verdade. 

     Eis então, a nova maneira como eu enxergo o nosso antigo relacionamento. Listarei algumas coisas que eu mais amava em estar com você e, em seguida, contra-argumentarei o porquê de elas não serem tão boas assim.
(Será? Agora, sim. Uma vez digerido o veneno serpentino, não há alternativa, se não o fim.)

Eu amava       sua família e a maneira como eles me amavam de volta tão gratuitamente
Eu amava       o conforto da sua casa e como tudo era tão simples e fácil
Eu amava       o fato de você ser irmã do meu amigo e como tudo era tão perto
Eu amava       o fato de ter me criado uma pequena família
Eu amava       sair com você e seus pais porque eu me sentia parte de uma família
Eu amava       sair com você e seus amigos porque eu não me sentia tão sozinho
Eu amava       ouvir suas histórias de viagens porque eu sentia como era viver naquela realidade
Eu amava       a realidade paralela em que você vivia
Eu amava       sua inteligência acadêmica e sua inteligência emocional
Eu amava       a maneira como você era fofa e meiga comigo
Eu amava       a maneira como você era tão tarada quanto eu e tava sempre excitada
Eu amava       transar em lugares inusitados com você e como você gostava disso
Eu amava       entrar no seu quarto de madrugada e te acordar com beijos e sexo
Eu amava       a maneira como você me compreendia e me idolatrava
Eu amava       a maneira como você me achava incrível pelas minhas megalomanias de filantropia
Eu amava       seu todo seu gosto pela arte, pela música e pelo cinema
Eu amava       como a gente podia passar horas conversando e se esquecer do tempo
Eu amava       como você aceitava a pessoa defeituosa que eu era 
Eu amava       o quanto você se esforçava para as coisas ficarem bem entre a gente
Eu amo           o quanto você ainda tentou fazer as coisas ficarem bem. Eu sei que você tentou.
   
     Nada disso é sua culpa. Não é culpa de ninguém, e nós realmente não fomos feitos um para o outro. Ao menos é a realidade que se propôs para nós. Talvez, se tivéssemos continuado tentando, poderia dar certo. Mas se essa possibilidade não te interessava, tudo bem. C'est la vie.
     Depois de um tempo ficou claro para mim o porquê eu gostava tanto de ti. Você me deu aceitação, amor e uma família, coisas que nunca tive para mim mesmo. Era isso que eu mais adorava na gente. Era tudo tão cheio de amor que era difícil ver problemas naquilo tudo, mas eles existiam. Depois de um tempo, todo aquele amor me serviu como álcool que me cegou do meu propósito, tal qual cega a visão do esquivo ébrio nas esquinas.
     Toda o propósito da minha existência gira em torno do quão o mundo foi injusto comigo. Quando nos unimos, o mundo me deu de sobra tudo que antes me faltava. Isso me fez esquecer do meu propósito. Eu quase me via largando tudo só para ser feliz com você. Mas eu preferi adotar outra perspectiva das coisas.
     Eu prefiro enxergar que o Universo sorteou a mim para entregar o melhor presente de todos. Ele me deu aquilo que desde pequeno me negaram, e eu aproveitei. Aproveitei cada segundo. Sempre quis um seio familiar que me aceitasse e que compartilhasse o sagrado café da manhã e as notícias do dia comigo, ao cheiro do café torrando e do leite que o esfria, permeando o ar. Sempre quis ir a uma orquestra com a família e amigos dentro de um carro lotado, conversar sobre coisas banais e caminhar apertando a mão de alguém. Eu aproveitei o que me foi dado.
     Essa foi a perspectiva que eu adotei: o universo finalmente me recompensou. Acontece que todo prazer prolongado se torna sua própria forma de punição, e foi isso que você se tornou para mim. Eu ignorei meu destino uma vez. Não o farei novamente, mesmo que por você.
     Margot, me desculpa, mas eu não posso continuar pensando que você era a garota certa para mim. Se fosse, teria compartilhado meu destino comigo, e não condenado a nós dois por eu tê-lo abraçado. Você teria agarrado a minha ambição e compreendido tudo completamente, mas isso estava além da sua capacidade e não é algo que eu posso cobrar de você. Não era você. Não era para ser.
     Depois que você me deu aquela máscara e eu desci as escadas, sentei naquele mesmo sofá em que estávamos conversando e liguei para o meu pai. Derramei-me em lágrimas ao ouvir sua voz. Logo depois fui a sua casa e ele me disse algo: "ninguém foi feito para ninguém."
     Eu decidi acreditar em suas palavras. Sabe... Aposto que existe neste mundo um número de pessoas que daria certo uma com a outra porque suas virtudes se encaixam. Acontece que existem imperfeições no maquinário de nossas personalidades que faz com que seja impossível uma convivência "eterna" com algumas dessas pessoas. Por isso terminamos. Em tese, somos perfeitos um para o outro. Na prática, meu objetivo de vida e sua insegurança tornaram isso impossível. Talvez se nós não tivéssemos acontecido agora, mas no futuro, momento em que você e eu aprendemos a lidar melhor com isso com outras pessoas, talvez então, poderia ter dado certo.
     Servimos como aprendizado um para o outro. Eu aprendi que devo dar mais importância e estar mais presente para aqueles que me amam. Você eu não sei o que aprendeu, mas espero que algo de útil e proveitoso tenha tirado de tudo isso.
     Por isso, eu sou extremamente grato por ter te tido na minha vida. Você me deu as melhores experiências e isso ninguém nunca vai tirar de mim. Eu vou seguir a minha vida e provar que nosso fim não foi gratuito. Eu vou realmente tocar o mundo. O sacrifício que fizemos um ao outro não foi em vão.

(Isso foi escrito há muito tempo. Por algum motivo não publiquei, mas acho que fora escrito pouco tempo pós o término do dia 21 de junho de 2019. Não quero ler agora. Apenas o publicarei.)





quinta-feira, 20 de junho de 2019

Falência Múltipla

     Morte! Ela mesma. A morte. Ela ecoa em meus ouvidos, como iminente catástrofe. Antes fosse isso. Se eu morresse amanhã, viria ao menos fechar meus olhos minha triste Margot. Minha namorada de saudades morreria, se eu morresse amanhã. As vezes, é assim que desejo que fosse. Assim, morreria como mártir. Seria pardonado por todos os pecados e sepulcrado, seria, meu corpo.

     Lágrimas derramariam ao meu leito. Donzelas apaixonadas e desapaixonadas, amigos de afeto e desafeto, familiares próximos e distantes, e quem sabe até mesmo alguma carpideira se fizesse presente, se eu morresse amanhã. Não. Anime-se um pouco, pois nem de longe vejo isso como uma alternativa. O suicídio é o caminho dos doentes e dos covardes, coisa que não sou.

     Mas, então, quem sou eu? É uma pergunta válida, porém, no contexto empregada, torna-se confusa. Ao primeiro escrever nesta nota, tinha o objetivo de escrever algo para Margot, minha donzela, e, agora, questiono-me sobre minha existência? Por que será, então, que as duas coisas relacionam-se..? Somos seres independentes. De forma alguma, somos, realmente, feitos um para o outro. O Romantismo diria que sim, fomos. O Realismo, por outro lado, riria da minha cara.

     Se essa é a verdade, então, por que tu, homem, criaste o Romantismo? A vida não bastava para ti? Não bastava nascer, mesmo que sem voto neste pesar, sofrer e morrer, assim como todos os outros que te precederam? Para quê criaste o romance e o fizesse o almejar de muitos, fantasia para poucos? A verdade, eu admito, não sei. Mas posso, no entanto, especular sobre ela. A historiografia não nos permite ter certeza sobre, certamente, nada. Tudo pode ser, afinal, uma grande forja. Podemos, ainda assim, considerar hipóteses plausíveis, e acho, ainda, sensato fazê-lo. Vamos lá então...

     Lá estava Adão, sozinho. Olhava para o horizonte e via ele os animais a pastar. Bois, macacos, guaxinins, tamanduás, tatus, tico ticos, graúnas e, eventualmente, até mesmo uma baleia, que submergia quando ficava sem fôlego. Todos esses animais, com seus parceiros, vivendo, em harmonia e monotonia. Adão, nesse momento, sentiu duas coisas: inveja e tédio.
     Inveja, porque como podia todos os seres terem alguém semelhante e, ainda que paradoxalmente, diferentes, para partilhar suas aventuras, desventuras, tristezas, agonias, emoções e até mesmo fluidos corpóreos. Adão, então, invejado, balbuciou em silêncio. Contentando-se com a infelicidade de sua existência. Mas contentou-se, ainda assim. Viveu, então, por mais mil anos, em harmonia e monotonia com os animais, ainda que sem mulher. E foi assim que nasceu seu tédio.

     Adão, por fim, enlouqueceu. Largou as balbucias e soltou um urro de fúria ao deus Aton:

- Diabos! Sim! Diabos! Por quê eu?!

     Aton, malandro que sempre foi, desde que o Universo fez-se o Universo, olhou indiferente para Adão, como que esperando um complemento de sua frustração, mas sem, no entanto, esboçar qualquer reação. Assim, retomou Adão seu raciocínio.

- Me deste o paraíso, seu maldito! Me deste todas estas terras, a riqueza que com elas veio, a fartura de com todos estes animais poder me alimentar, me destes os céus para observar, as águas para me banhar, e a imensidão para vaguear. Me deste até uma maldita árvore cujo qual os frutos não posso me alimentar, e disto nunca fiz questão. Mas sou incompleto. Por que tu me fizeste assim? Por que fizeste isso comigo?

     Aton quebrou o gelo secular que havia mantido por todo aquele milênio. Aproximou-se de Adão, largou um velho e empoeirado sorriso de canto de boca e perguntou:

- O que queres, então, pobre rapaz?

     Adão, coitado, não soube responder. Soube apenas argumentar:

- Sou sozinho. Todos os serem tem companhias para si. Até mesmo o Sol, que nem é bicho, tem a Lua para si. Eu... Não tenho nada... De que vale toda essa imensidão física se nem mesmo posso compartilhá-la, ainda que com a incerteza sobre qualquer coisa? Sou imortal. Eu nasci mas não vou morrer, e assim é o presente. Estou aqui, e estou vivo. Isso é ser imortal, porque não acaba. Um dia, de certo, acabará. Mas até que esse dia chegue, eu sou vivo, e permanecerei assim, sozinho, sabe-se lá até quando. Sabe... você criou aquela árvore para nos dar a incerteza. Para simbolizar a insegurança da vida e a perenidade da dúvida. Cogito Ergo Sum eu disse, mas de que adianta questionar, se, no fim, não existirá significado algum. Será tudo o mesmo..?

     Aton não soube o que fazer. Nem mesmo compreendera o que havia dito o Homem. Era o alpha e o omega, mas ainda assim não podia conceber as articulações de sua criação. Fez-se de de tolo, ainda assim. Manteve o sorriso, estimulando Adão a continuar. E Adão procedeu:

- A vida que tu criaste não tem sentido, velho senhor. Nada aqui tem um real propósito. Vê aquela montanha ali longe? De que adiantará que eu lá suba e entoque no ponto mais alto de sua magnitude um graveto? Ninguém estará lá embaixo para me congratular. Vê aquele pântano, completamente inundado e impossível de se transpor? De quê adiantará drená-lo, e lá fixar moradia, se não tenho ninguém para compartilhar o conforto do meu casebre? E aquela terra ao norte, cuja mata é branca de quase morta, e não muito se pode fazer para viver nela. De que adiantaria, com cuidado e amor, regá-la e trabalhar para ali cultivar, se só eu, sozinho, poderia usufruir da safra porvir? Vê, eloquente e magnânimo senhor, que não há sentido em nada se tudo farei sozinho.

     Aton ouviu as palavras do infeliz e inacabado ser. Não compreendera suas indignações, mas indagou a Adão:

- E se eu criasse outro semelhante a vós para que, com ele, você pudesse partilhar a vastidão deste universo?

- Não posso dizer que seria grato. Continuaria sendo imperfeito. No entanto, não seria imperfeito sozinho. Teria alguém com quem partilhar a dor e as as mazelas da vivência.

- Esteja feito, então.

     E, ao estalar de seus dedos, aquele grande Titan desapareceu. Fez-se o mundo escuro, até que, em poucos segundos, que quase pareceram uma eternidade, devido a confusão da escuridão ao meio dia, fez-se luz novamente. Adão estava deitado. Não lembrava-se da discussão que a pouco tivera com seu criador. A unica coisa que pudera notar era aquela figura a sua frente, a lhe tocar. Parecia não compreender o que era tudo aquilo. Tinha em si um olhar de terror e de surpresa, apreensão e curiosidade. Lembrara a Adão, mas não sabia de onde viera o pensamento, animais pequenos e felpudos que lembrara ter chamado de "gatos". Quando "gato" percebeu o despertar de sua presença, assustou-se. Levantou-se de um pulo e deu um passo e meio para trás. Pensara em correr mas hesitara. Estava a questionar tamanha semelhança e disparidade à sua forma.
   
- Quem é você? - questionou "gato".

- Sou Adão. - Retrucou em impulso, sem entender de onde vinham suas palavras.

- Eu sou Eva. Somos diferentes e, ainda assim, não há nada ao redor que me faça lembrar a minha forma, assim como não há nada ao redor que remeta à sua. Você tem uma coisas pendurada em sua pele que eu não tenho, e eu também tenho coisas penduradas em mim que você quase não tem, ou tem de menos. Quem somos nós e o que fazemos aqui?

     Adão recordara-se do que aconteceu. Ele pedira ao seu criador que lhe trouxesse alguém para compartilhar as calamidades daquelas terras. Alguém com quem ele pudesse compartilhar as maravilhas e belezas do mundo, assim como questionar a dubiedade da criação. Então contou-lhe, Adão a Eva, sobre o mundo. Andaram até o Sul, e Adão mostrara ao outro os peixes. Mostrara-lhe aqueles que eram pequenos e coloridos, das mais variadas cores: amarelo, ciano, rubro, magenta e violeta e lilás. Mostra os médios, que era roseados e saltitantes. O outro ser demonstrou interesse por esses, mas demonstrara mais ainda pelos peixes grandes. Eram estes negros, com olhos e barriga branca. Eles jogavam aos céus alguns outros de cor cinzenta, até que lhes houvesse quebrado os ossos para facilitar a mastigação. Era dúbio. A morte, a vida, a alvorada e o crepúsculo.

     Cansaram-se do mar e decidiram vaguear em outra direção. Dessa vez, direção avulsa. Observaram ao longe o céu escurecer repentinamente. Perceberam que a negritude vinha de uma direção, e nortearam-se em direção aquele caos. Bem abaixo de onde se encontrava aquela tempestade de cinzas, que era a orgiem de todo o empoeirado, estava uma grande monte enraivecido. Subiram nele e, lá de cima, olharam para o seu centro. Viram labaredas de chamas cor alaranjada, com pequenos pedaços que pareciam sumir e surgir a todo o momento de cor escura-azulada. Não entenderam o que era tudo aquilo, entenderam apenas que estar por perto não era agradável. Olharam ao horizonte, por onde a fumaça percorria e as formas vermelha-alaranjadas escorregavam, e perceberam a destruição ao seu redor. Mas foram mais sábios que isso, perceberam que após a destruição, a paisagem natural era mais bonita do que a posterior, e que ela era mais bonita o quanto mais se aproximava do que resolveram chamar de "lava". Não compreenderam a complexidade de tudo aquilo, mas também não importaram-se com o que os cercavam. Cansaram-se de andar e resolveram deitar para repousar na sombra de uma bela árvore de frutos luminosos.

- Eu não compreendo nada disso. - Disse Eva, em estado reflexivo.

- Eu tampouco. As vezes me parece que tudo a ser feito é apenas observar. Somos tanto paisagem quanto tudo que nos cerca... E qual o propósito? Não há, acredito eu. - Completou Adão.

     Foi então que um daqueles frutos luminosos acertou em cheio a cabeça de Adão. Ele olhou para o fruto e o examinou. Ele brilhava e parecia ser tentador, sem aparente motivo. Ao tocá-lo, sentiu que a dúvida e a incerteza que norteavam seus pensamentos provocaram maior aflição. Eva reparou o que estava acontecendo com o confuso rapaz a sua frente, e resolver tomar para si o objeto tentador. Sentiu o mesmo. Ela, no entanto, sentiu vontade de comê-lo. Sabia, intuitivamente, que aquilo saciaria sua fome. Não a fome fisiológica, mas a fome intelectual.
     Em um impulso, ela direcionou o fruto à boca, mas Adão a repreendeu. Lembrou-se do mau sentimento que aquilo lhe provocara e sabia, no fundo da sua consciência, que não devia fazê-lo. Sentiu medo. Explicou, sem êxito em ser compreendido por Eva, o que sentia.
     Foi então que as folhas daquela arvore, e de todas as outras semelhantes àquela, começaram a chacoalhar. De cima dela vieram seres que Adão nunca havia visto antes. Eram semelhantes a ele, porém, de maneira diferente a de Eva. Andavam em quatro patas na maior parte do tempo e, por vezes, ainda que em dificuldade, suspendiam os membros superiores para articular. Eram totalmente peludos e tinham pés que pareciam com as mãos. Adão se assustou. Eva, porém, aceitou o estranho com empatia. Percebendo que aqueles seres vinham em sua direção, abriu um sorriso convidativo.
     Eles todos traziam na mão aquela mesma fruta luminosa que causara estranhamento aos habitantes anteriores. Desfrutavam de seu sabor sem preocupação alguma. Pareciam, na realidade, até mais calmos. Adão não compreendeu a cena. Lembrava-se do criador lhe dizendo que, uma vez provado o sabor daquele fruto, não haveria volta. Ele estaria condenado. Não lhe dissera, porém com o quê. Assim, aos sussurros, Adão contou a sua amiga o que sentia. Ela lhe encarou com estranheza.
     Os outros, que assistiam a cena, riram entre si. Foi aí que disseram:

- Humano tolo! Não percebe o que te cerca! É tudo seu! Os mares, as terras, os animais, os prazeres e os pecados. São todos seus! Tu não segues em frente por medo. Medo de se machucar e medo do incerto. Prefere continuar nesta vida pacata tua de certeza. Você não pode morrer, mas, também, não pode viver. Coma o fruto. Ou não. Faça sua escolha. Você, de alguma forma, sabe o que lhe aguarda.

     E ele sabia. Adão entendia o significado do fruto. Para Eva, era mais claro. Ela sabia o que deveria fazer. Sabia as consequências, mas tinha certeza do que deveria fazer. Havia de comer o fruto.

- E quanto a morte? Que sentido teria tanta beleza se não pudesse viver eternamente para contemplar toda a beleza natural das coisas?

- Baah! Que se dane a morte! E que sentido teria tudo isso se pudesse vê-lo para sempre? A virtude da beleza só pode ser encontrada no momento em que você decidir viver com as incertezas e sofrimentos que a precedem. Nada realmente terá valor enquanto uma gota de sangue não for derramada para solidificar a estrutura. Teu Deus é todo poderoso. Ele criou tudo isso, de fato, com um estalar de dedos. Mas tu, coitado, é só homem! Nunca terá capacidade para evoluir e fazer-se tao Deus quanto aquele que te criou enquanto não dar um passo que é desconhecido e amedrontador.

     Eva comeu o fruto, e logo que sentiu o sabor da fruta entre seus lábios, compreendeu o que os outros tentavam lhe dizer. Adão era o único desentendido da história. Ela lhe explicou:

- Adão, amor meu, tu não perceber porque não tomou uma decisão. Você nasceu no conforto deste mundo, e com ele se acostumou. Nunca saberá o que lhe espera enquanto não comer a fruta. Não há o que ser explicado, pois é tudo uma questão de escolha. Por favor, meu bem, olhe para a luz que emana deste fruto, e coma-o.

     E foi assim que, por um impulso generoso, Adão comeu o fruto. Fechou os olhos. Sentiu o suco percorrer sua língua e escorrer sua boca. Saboreou, mastigou e engoliu. Então, quando não restava nada mais dentro de sua boca, abriu os olhos e viu-se nu. Mas não sentiu vergonha, pois todos ao seu redor também estavam.

     Percebeu, porém, uma voz, que vagava pelas redondezas gritando seu nome. Era Aton, e não lhe parecia mais tão grande assim. Antes era um Titan. Agora, apenas um velho carcomido.

- Adão, - dissera Aton - Percebes que estás nu. Por acaso comera do fruto proibido, como eu não lhe aconselhara? Maldito seja. Dei-te uma mulher e terras. Dei-te a natureza inteira para ser de tua posse e como tu me pagas, ingrato! Por esta blasfema, à tua mulher, multiplicarei a dor do parto. Ambos agora morrerão. E, ainda mais, a ti, darei a...

     Adão o interrompera:

- Ao inferno com você. Pouco me importa o que me acontecerá. Compreendo agora que a vida só pode ser concebida se for forjada por medo e incertezas. Do futuro certo, nada se espera. Do incerto, por outro lado, tudo se pode esperar. Ele é o único que pode me oferecer algo que me agrada. Nada poderia vir de ti, da segurança, da certeza, do conforto e da clareza. Do incerto, por outro lado, tudo se pode esperar. Ao inferno com você. - Disse Adão enquanto dava na fruta outra grande e suculenta mordida.

     O velho Aton se sentiu desanimado. Sua postura tornou-se curvada e, vagarosamente, andou em direção ao horizonte. Adão olhou para ele, seu pai, sem remorso ou culpa, pois entendia que era necessário dar um passo à incerteza para, incertamente, alcançar a felicidade.

     Eva abraçou-o por compreender o pesar de sua atitude. Estava feliz com a atitude de seu cúmplice em aceitar as dores do mundo para viver, com ela, uma vida sofrida. Estavam nus. Sempre estiveram. Mas só agora perceberam, e só agora tiveram oportunidade de fazer juntos aquilo que é de natural relevância para os casais. Os homens primitivos não estavam mais por perto. O mundo era deles para fazer o que quiser...

     E este é o meu mito da criação do romance. Ele existe porque, na realidade, que diversão teria a vida, sem uma pitada das lágrimas salgadas que vêm com ela? É como no parque de diversões que vamos vez ou outra. Se nos fosse dada a capacidade de ver se chegaríamos em casa, no fim da noite, em perfeito estado, vivendo naturalmente com a mesma saúde com a qual chegamos ao recinto, não nos divertiríamos nos brinquedos. Nos divertimos, por outro lado, por medo da morte. Ninguém realmente morre nesses brinquedos, mas é a incerteza e o medo que sentimos que faz tudo ser tão gostoso.

Garoto Comum

20.06.2019

16:57

quinta-feira, 14 de março de 2019

Fearless Girl

   A ultima vez que escrevi para estas notas malditas, purgadoras desta pecadora alma minha, foi quando completamos um mês de namoro. Agora, já se foram cinco. Além disso, para adicionar à majestosidade desse eventos, tu completaste dezessete anos de presença nesta terra.
   Bom... acho que se eu tivesse hoje dezessete anos novamente, a única coisa que desejaria era conselhos meus do meu eu futuro. Isso para que salvasse me o tempo em cometer erros desnecessários. Mas não acredito que isso lhe será útil. Steve Jobs uma vez disse em um famoso discurso que não é possível conectar os pontos olhando para o futuro. Apenas é possível ver a grande imagem do caminho que traçamos em nossas vidas olhando para trás. Apenas assim tudo faz sentido.
   Por isso, devo lhe dizer que você não deve ter medo de certas coisas.
   A primeira delas é cometer erros. Não se deve temer os erros. Eles são quem nos fazem pessoas melhores. Deve-se, por outro lado, cometer o máximo de erros possíveis, salvo aqueles que podem comprometer-te a vida, claramente. Eu penso isso porque não é possível prever o desenrolar dos fatores em nossas vidas. Como Maquiavel disse, e você deveria saber disso pois lhe emprestei seu mais importante livro, devemos olhar para os homens do passado e tentar imitar seus atos, almejando suas conquistas, mesmo que não se possa imitar totalmente o passado. Por isso, então, você deve cometer muitos erros e sentir-se orgulhosa deles, pois é a única forma de aprender: com o passado.
   A segunda é sobre ambição. Ela é importante. Saiba disso. Sem ambição, claro, homens não teriam sido postos em correntes e chicoteados até seu último suspiro para satisfazer desejos terceiros que nunca lhes deram satisfação. Porém, esses foram os homens corruptos da história. Aprenda com o erro deles também e não corrompa-se como fizeram. Seja, por outro lado, ambiciosa, fazendo o que é correto. Os corruptos tem uma vantagem sobre nós, pois eles não jogam pelas regras. Eles burlam o cenário para encontrar o gran finale que lhes é conveniente. Por isso, nós, os bons, não devemos temê-los. Devemos dar nossos peitos abertos ao abate, caso necessário. O pureza de nosso sangue, derramado sagradamente, conjugará tamanho feitiço sobre os impuros que, no fim dos tempos, perceberão a franqueza de nossos sentimentos. Assim, seremos santificados. Subiremos aos elísios e, lá, encontraremos todos os outros francos que deram sangue pelo que é bom.
   A terceira é a ousadia, acreditando ser a mais importante. Sem ela, ganham os fracos e os covardes. Deve tornar-te uma mulher inquieta quanto às maldades e incoerências do mundo. Nunca deixe que digam-lhe o que fazer. Questione tudo, inclusive, e principalmente, as autoridades. Muitos deles agem como se o poder que lhes tece o punho tornasse os fatos, caluniosos que sejam, verdadeiros. Mentira. Os fatos verdadeiros é que tornam as pessoas autoridades, pois elas são coerentes com as verdades da natureza e do universo. Revolte-se. Ainda que lhe custe sangue, a integridade da sua pessoa deve manter-se intocada. Abaixar a cabeça para aqueles que usam da autoridade para impor mentiras é o mesmo que unir-se a eles. Dê o braço a torcer e, se necessário, dê sua vida, apenas para expor a verdade, pois ela não lhe pertence. A verdade pertence ao mundo. Assim, esconder esta pérola oceânica dentro de sua concha, divido às dores interiores, seria meramente egoísmo.
   Não sei quem você será daqui há um ano. Sei quem você foi ontem. Hoje, já não te conheço. Tampouco conhecerei amanhã. A realidade muda a forma, tal qual o tempo, o vento, a chuva e os rios corroem e deformam as paisagens. No entanto, espero que, quando chegar lá, siga esses ideais. Acredito que são os princípios da pureza humana, e eu pretendo que você se mantenha pura no futuro como se mantém hoje. Eu não amo sua carne. Eu não amo seus olhos. Eu não amo sua forma. Eu amo a verdade. Logo, aprecio sua existência, pois ela representa o valor dos seus ideias, personificando a bondade. Assim, em congratulações à existência deles, congratulo tua existência, pois ela é o que eu espero ver no mundo inteiro, e cultivar tua existência, celebrando-a hoje, me parece uma boa ideia. Feliz Aniversário, Margot.













quarta-feira, 7 de novembro de 2018

Um mês

   Hoje faz um mês que começamos o namoro. Não acho que as coisas poeriam estar melhor. É incrível como a alma dela planta raízes no meu mundo a cada dia. Sempre que me imagino em um futuro qualquer, lá está ela, ao meu lado, sempre sorrindo. Nossa simplicidade é algo magnífico. Acho que a maioria espera de mim descrever a garota pela qual me apaixonei como algo magnânimo! e excelentíssimo!. Não é.
   Ela é uma garota comum. Tem 16 anos. Gosta de musica, pintura, teatro, literatura, dança e qualquer outra modalidade artística que puder imaginar. Sua pele é alva. Quase tão alva quanto a neve. Seu cabelo é uma quimera de graúna dos céus, escura e macia, de onça das selvas, dourada e selvagem, e das algas dos mares, verdes e sutis, tal qual o balanço que sofrem das ondas no fundo do oceano. As vezes me parece que ele muda com seu humor. Uma coisa, no entanto, nunca mudou: aquela castanha mecha de cabelo na franja partida que ela usa. Acho que os detalhes importam.
   São pequenos pedaços de cada coisa que me causam uma profunda sinestesia e gosto de viver. Seu sorriso espelhado cega minha vista. Seu olhar profundo penetra minha alma. Sua risada tímida vibra o ar aos meus ouvidos, tal qual fazia Beethoven vibrar as notas de seu piano. Seu cheiro intenso e único impregna minhas roupas, esvaindo-se com o tempo, mas permanecendo em meus pensamentos. Seu toque... é inflamável! Basta um aperto de corpo e línguas para ascender ardor animalesco da mais íntima fera da natureza humana minha. E, ainda assim, simples, como qualquer outra garota.
   Pode me chamar de Álvares de Azevedo, se quiser. Não me importo. Me importo apenas com a honestidade das minhas emoções e com a perspicácia de minhas escolhas. Seria sensato pensar que foram esses os motivos pelo qual me apaixonei. Não foram. Engana-te leitor. Por mais que a força dos quadris de uma mulher muitas vezes fale mais alto na mente de um homem do que fala seu coração e sua consciência, a mim, superficialidades nunca enganaram. Entenda-me então...
    Quando percebi a virtude de sua alma, foi quando me apaixonei. Ouvi-la dizer que também queria ter seu papel de relevância no mundo, que queria fazer dele um lugar melhor e que isso era o que bastava. Foi isso que me cativou. Houve um ponto em que a olhei e vi um belo rosto, um sorriso simpático e uma voz serena. Em outro ponto, seu rosto estava sério, seu sorriso tornou-se fala e sua voz transformou-se em poesia. Falava-me sobre o que pensava e sobre como via o mundo, sobre o que julgava certo, o que parecia belo e o que lhe frustrava.
   Foi aí, então, que me apaixonei, vendo tão bela alma carregando tão belo corpo. Uma combinação de virtudes. Um arranjo de eventos e possibilidades, totalmente aleatórios e, ainda assim, resultaram nisso: união quase perfeita de duas almas tristemente separadas. Eu li em algum lugar que, no começo, homens e mulheres viviam juntos em um corpo só. Aí, por algum feitiço malvado, assim de um deus perverso, foram separados em sexos. Homem para um lado. Mulher para o outro. Dessa forma, vagariam as partes ao mundo a procura de sua outra metade que, por fim, ao encontrarem-se, brigariam futilmente numa dança de saliva, suor e sêmen, tentando se unir.
   Seria triste pensar que um dia vivi no mesmo corpo que ela. Seria triste saber que futilmente lutamos para nos unir agora, pois futilmente tentamos alcançar algo que nunca conseguiremos. Eu espero que, em algum momento de nossas experiências nesse plano terreno, por alguma autoridade suprema da metafísica, nos seja concedido o desejo de união. Espero, ainda, que prolongue-se à eternidade.
   Gosto verdadeiramente de ti, e espero, futilmente, que esse momento nunca acabe. Está sendo o mais próximo da eudaimonia que eu poderia chegar. Apenas um laço de cumplicidade até o fim dos tempos poderia fazer o que eu sinto hoje o mais próximo possível da perfeição.
   Desculpa Garota. Eu não posso te prometer que serei teu para sempre. E nem tu pode. Não serei eu hoje o mesmo rio em que tu se banhaste ontem. Mas eu espero, por alguma magia de algum espírito benevolente, que as águas do meu rio parem, que parem o tempo e o espaço. Que dilatem-se! Só para que tu possas banhar-se com o maior gozo dos nossos tempos, na liquidez da minha vida.
   Que um mês, assim, torne-se um ano. Que um ano torne-se dez e que dez tornem-se cem e que cem voem aos céus, em espiral de pássaros apaixonados, e nos façam imortais.
   Você me deu um mês da tua paixão. Te darei então, todo o calor e carinho que há assim dentro do imenso do meu coração. Uma provocação, ardendo intensa e ferozmente como a rocha brasa do calor de um vulcão. Um mês Margot. Um mês... Até logo.

segunda-feira, 8 de outubro de 2018

First Fuck


  Exatamente como estou fazendo agora, estava fazendo como ela me ligou. Lembro-me de ter desligado e olhado as horas. Eram exatamente 14:30. Ela me disse que já tinha chegado no local de encontro e que ia me esperar, já que tinha chegado bem mais cedo do que esperava.

- Vacilo... Eu vou tentar agilizar as coisas e então vou aí

- Tudo bem. Tchau.

- Tchau.

   Finalizei em 2 minutos uma escrita qualquer que fazia e fui tomar banho. Escovei os dentes, comi qualquer coisa e fui ao seu encontro. Enquanto esperava pelo ônibus, tentava aplicar as meditações de Epicteto sobre concentrar sua atenção apenas no que se pode controlar. Mas, sinceramente, quem faz isso? A garota estava já me esperando há uma hora, e eu não deveria me preocupar com quando o ônibus chegaria?
   Bom... Felizmente ele chegou, provavelmente bem mais cedo do que me pareceu... Minutos podem durar eternidades quando você está com pressa. Subi, paguei minha passagem, aconcheguei-me do lado de uma moça, agarrei em uma das barras e esperei. Em um momento da viagem, alguns vadios pularam a catraca. Esse tipo de coisa muda totalmente meu humor. Mudei minha fisionomia e preparei-me pelo que estava por vir, o que quer que estivesse. Preenchi meus pensamento de mil maneiras em como poderia ter devorado suas gargantas e arrancado suas cabeças. Imaginei-me socando tão forte em suas caras que o sangue jorraria por todos os lados. Eu realmente espero que esse tipo de coisa nunca aconteça. Alguém vai sair disso sem vida. Talvez eu.
   Com sorte, nada aconteceu, além de terem explodido os meus níveis de cortisol. Desci do ônibus à beira do shopping e caminhei até o encontro de minha bela.

- Ela já me espera há uma hora e meia. Deve estar maluca de raiva.

   Não estava. Caminhei até ela, perto daquela mesma fonte de águas cantantes e harmônicas. Antes disso, comprei dois sorvetes e fui comendo um no caminho. Quando nos encontramos, dei-lhe o sorvete e alguns beijos. Beijos de carinho, em sua maioria. Talvez seja aí perceptível quando se tornam claros os interesses de alguém. Raciocine você em qual a graça existir em beijar a testa ou a bochecha de alguém? Não existem fetiches por testas nem por bochechas. Existem por pés, de fato. Mas nunca me deparei em pornôs por testas.
  Estranho, então, porque era exatamente aí onde mais lhe beijei quando nos encontramos. Talvez como uma demonstração de afeto. Só talvez. Talvez eu tenha fetiches estranhos. Improvável. Eu só estava muito apaixonado. Sentia querer agarrá-la para mim e lhe fazer carinho. Nada de sexo. Nada de sodomia. Nada de perversidades e obscenidades. Só puro e ingênuo carinho.
   E assim foi, até o horário do cinema. Compramos o filme da freira e fomos até a sala 10 para assisti-lo. Muita gente.

- Tem muita gente aqui, disse eu, claramente demonstrando minha frustração. A gente pode tentar invadir outra sala desse mesmo horário que não esteja tão lotada, continuei.

   Procuramos juntos alguns horários e achamos um filme. Sansão. Saímos da sala, caminhamos até a sala 12 e... UFA.... A primeira fileira de cadeiras tinha apenas uma pessoa. Ela estava lá no fundo. Era aceitável. Nos sentamos o mais longe possível desse cara e começamos. Divertido como essas coisas não são planejadas mas simplesmente acontecem como se houvesse um protocolo. Foi divertido.
   Começamos com alguns beijos casuais, algumas mordidas e apertos nos seios. A mão dela foi rápido pro meu pau. Já estava bem duro por ela. Nesses momentos qualquer homem se torna um animal e se deixa levar pelo cheiro. É uma espécie de bebida que te deixa tonto e te coloca em um modos operandi. Modos operandi de sexo. Ela subiu em cima de mim e começou a cavalgar, roçando encima dele. E me deixava maluco. Minhas mãos que já estavam em outros lugares desceram. Foram até embaixo, até que eu senti o lugar. É como se ela estivesse esperando por isso.
   Puxei a calcinha dela e enfiei meu dedo em sua buceta, e, a cada movimento que fazia com meus dedos, ouvia um gemido. Era uma espécie de impulso. Um combustível que só me deixava mais louco de tesão por ela. Tirei o dedo, agarrei-lhe o cabelo e mordi com força seu pescoço. Mais um gemido, e dos mais altos.

- Quero ver até onde tua coragem vai, tentei excitá-la mais ainda a fazer algo diferente.

   Ela se afastou um pouco de mim, apertou meu pau e abriu minha calça. Puxou meu pau pra fora e começou a me masturbar enquanto mordia minha boca. Poucas coisas me dão tesão assim. Depois de um tempo, ela desceu e começou a me chupar. Realmente, muitas poucas coisas me dão tanto tesão assim. Acho que o mais difícil de tudo foi gemer baixo para que ninguém escutasse.
 Quando ela se levantou, agarrei sua cintura e inclinei me para a frente, deixando-a cair de leve encima da poltrona. Sexo em cadeiras de cinema pode ser algo bem desconfortável. Prazeroso, ainda assim. Não tirei minha boca do pescoço dela. Era difícil, o suor e o os gemidos davam-me uma sensação de prazer alucinante. Foi aí que eu lembrei que tinha colocado uma camisinha no bolso antes de sair de casa.
   Ela recebeu a ideia com entusiasmo. Abri o pacote, coloquei e deixei que ela fizesse o resto. A maioria das garotas gosta de algo lento. Gostam de bastante pressão e lentidão. Essa não. Ela gostava de vigor e velocidade. Ainda bem que eu sou um atleta. Fui indo cada vez mais rápido sempre que ela gemia mais forte. Ela pedia mais velocidade e me chamava de nomes. Eu simplesmente obedecia.
   Ela gemia cada vez mais alto, e eu, quase sem resistir àquela tentação, ficava muito perto de gozar. Mas ainda existia algum desconforto sobre estar em uma sala de cinema cercado de pessoas. Acho que ela não pensava assim. Tive que tapar sua boca para evitar os gemidos nos momentos de silêncio do filme. E ela fazia o mesmo. Foi uma transa bem inteligente.
   Quando eu percebi que não ia passar muito daquilo, decidi dar tudo que tinha e finalizar aquilo. Ela se tremeu e me disse que não parasse. Depois de alguns minutos, parei. Ela parecia satisfeita. Eu estava satisfeito. Sinceramente, não sei se ela gozou. Eu não gozei. Mas gostei pra caramba. Entrei em uma espécie de nirvana depois daquilo.
   Joguei a camisinha no chão, coloquei minha mão nas pernas dela e conversamos até o filme acabar. Quando as luzes acenderam, um multidão de pessoas se levantaram. Foi aí que eu percebi o que todo mundo tinha percebido. Algumas mulheres mais pro final das cadeiras se levantaram olhando pra gente. Todo mundo tinha escutado e visto alguma coisa. Decidi não me importar.
   A gente se levantou e saiu da sala de cinema. Ficamos conversando sobre como a camisinha tinha saído em algum ponto e que deveríamos nos prevenir quanto à isso. Ela concordou e disse que ia tomar algo depois. Andamos e fomos até a praça de alimentação. Procuramos alguns cupons online e e compramos um combo duplo de hambúrgueres, batatas e refrigerante. Nos sentamos e iniciamos uma conversa diferente.
   Era diferente porque falávamos sobre coisas mais pessoais. Coisas mais profundas. Daquelas que só se conta pra alguém que se confia. Ela me contou sobre o último relacionamento, e sobre como tudo era muito abusivo e que nada era feliz. Eu compartilhei o sentimento. Meu último namoro foi algo parecido. Talvez não tão ruim quanto ao que ela me descreveu.
   Foi um dos melhores momentos. Ela abria o coração pra mim e eu me apoiava no corpo dela enquanto comia umas batatas e tomava refrigerante. O estado de nirvana subia cada vez mais. Foi aí que eu percebi que não tinha pra que evitar o sentimento. Era ela. Não ia fazer diferença se eu pedisse ou não. Ia continuar sendo bom daquela forma, e eu só queria que aquele momento não acabasse nunca. Foi aí que eu perguntei.

- E se eu perguntasse se você quer ser minha garota?

- Como assim sua garota? Ela disse com um tom de riso. Acho que não tava acreditando bem.

- Minha garota. Minha pequena princesa. Minha poetisa...

 Ela olhou pros meus olhos por uns três segundos com o sorriso mais belo, e disse que aceitaria.

- Está selado então, confirmei o nosso voto.

   Selei o nosso compromisso com um beijo e conversamos mais um pouco sobre nossos mais profundos sentimentos. Era tarde. Decidimos que deveríamos ir e fomos para casa.































sexta-feira, 5 de outubro de 2018

   E lá estava eu, deitado e sozinho. É engraçado como todo romance pode ser genérico e, ao mesmo tempo, único.

- Por que ela não me mandou mensagem alguma, ainda? eu me perguntava.

   Decidi há três dias atrás que estava cansado de ser aquele quem tem iniciativa. Sim. Entendo que no mundo em que vivo não posso esperar por ninguém. E por isso mesmo não espero. Mas não. Não espero isso dela. Não quero esperar. Por que alguém que clama ter por mim sentimentos não se importaria em mandar um "Oi" ou "Como vai?" dos mais simples e banais? Por insegurança.
   Percebi outrora que isso seria um problema e que bem provavelmente eu quem teria de apontar para essa brusca curva na personalidade dela. Não me é útil questionar ou indignar-me com os porquês. Existe. Está lá e assim será, até que alguém tenha a iniciativa de iluminar esse espectro da personalidade, e o outro alguém esteja disposto a mudar. Mudar porque ama e percebe que é um padrão corrosivo. Sim. Todos os padrões dos nossos comportamentos fazem parte de quem somos, mas de que adianta viver como Parmênides e não conquistar coisa alguma?
   A vida é uma constante evolução. Nem o rio nem você serão os mesmos ao segundo encontro. É alguma espécie de comodismo que eu mesmo lutei contra há algum tempo atrás. E por isso o cavalheiro decidiu entrar nessa nova cruzada: a de ajudar sua digníssima a ser como o rio, e não como a montanha, sólida e neutra durante os séculos, insistindo em permanecer intocada.
   Falácia. Até mesmo as montanhas sofrem eventualmente com a chuva ou com o vento. Serei eu, então, a chuva e o vento. Não quero, no entanto, dar a minha pessoa a fama de moralmente superior. Não sou nenhuma entidade que está no lugar de julgar os demais inferiores. Não sou nada disso. Mas reconheço que tenho minhas qualidades. Reconheço que existe uma eminência produtiva entre as duas almas que insistem em dançar ao passo da música, mesmo que o CD que a toque esteja arranhado e seus passos não sejam os mais suaves e equilibrados.
   Percebo que se tiver de ser, será assim: ambos precisam notar ou estar com ouvidos abertos às notas do parceiro. Precisam entender algumas atitudes como improdutivas e tentar lutar para a progressividade do fluxo. Conte-me, caro leitor. Conte-me como você se sentiria se soubesse de uma pessoa que diz te admirar, mas não move três toques ao celular para iniciar uma conversa? Conte-me, caro leitor, o que sente essa pessoa? É indiferença? É insegurança? É orgulho? É cobrança? Certamente não sei, e duvido muito que saiba você. E por isso estava eu lá... Deitado...
    Se algum dia formos um belo casal, quero saber que posso contar com uma atitude que venha dos dois lados. Quero contar com uma mulher de pulso firme. Eu sou homem o suficiente para lidar com todas as inseguranças do mundo, mas não quero ter que lidar com este tipo de problema por toda a minha vida. Quero contar com uma pessoa que partilha da minha força. Não julgo aqueles que não a tem. Nada mais é do que uma habilidade que, como todas as outras, pode ser desenvolvida.
   É cansativo, somente. Imagine ter você o mundo em suas costas e ter novamente que lidar com o mundo quando chega em casa. Chega de machismo. Qualquer mulher pode ter atitude como o mais implacável dos homens. Até mesmo ela. Por que não? Porque ela tem rosto de princesa, cheira bem e tem um belo sorriso?
   O mais potente dos venenos pode estar escondido na mais bela das rosas. E é essa a rosa com quem quero enamorar-me. A venenosa. A sangrenta. Aquela que não teme. Aquela que é temida.

...

   Romantismo. Tudo que quero é alguém que partilhe de algumas boas características minhas. Não posso viver com alguém que cultiva práticas improdutivas. É contra minha natureza.

- "Você está sendo paranoico." 

- "Talvez esteja, mas qualquer precaução é pouca."
   
- "Você está se levando muito a sério." 

- "Se não puder eu me levar a sério, ninguém o fará por mim."
   
- "Você está pensando muito para algo que ainda não é nada."

- "Talvez. Mas eu sei quando algo foi destinado para diversão e quando não foi."

Ai de mim se esta for apenas para diversão. Por isso, espero fielmente que nada disso seja em vão. Espero fielmente também não estar enganado, e assim, Universo, quero que me prove estar errado.